quinta-feira, 17 de junho de 2010

Digno.

Aquele olhar meio perdido e acastanhado, a mão tremendo segurando um documento qualquer de um governo fraco, alguns centavos na mão e pedidos: ajuda. Pedia moedas, centavos, notas. Tudo que, de certa forma, desse esperança de levar sua filha de nove anos de volta ao interior. Eu não tinha moedas no bolso, nem nada relevante para contribuir. Desculpei-me por algo que nem era mesmo minha culpa, era de um país miserável, era culpa da desigualdade social e esses outros termos que ouvimos sobre política. Um amigo ao meu lado, tirou de sua carteira uma nota avermelhada e entregou. Ele, muito agradecido por uma quantia tão grande e por minha atenção na sua história, foi-se caminhando por esses infinitos caminhos de gente perdida.
Os primeiros dias se foram juntos com os segundos, os terceiros e os quartos. Uma semana ou duas depois, sentada num banco de madeira qualquer, aparece os mesmos olhos acastanhados, com a mesma história, repetiu que precisava da mesma quantia que foi dada nas semanas anteriores, cantarolou os mesmos sofrimentos e desejos de um homem com dignidade. Pelo menos ele teve coragem, coragem de usar uma palavra tão pesada como dignidade em sentido tão oposto. Era tudo mentira, juntou o fato de ter unhas sujas, de ter camisa velha e de ter olhos carentes com a vontade dos outros de ter um país melhor. Usou figurino e sujou a imagem de quem realmente precisa, de quem realmente é digno. Fez, com as palavras recheadas de mentira, com que a esperança que parecia tão participativa no seu rosto causasse esperança na gente. Fez com que desejássemos com muita força o reencontro dele com a filha, esperançosos com mudanças e doações: caímos. Não me reconheceu quando foi contar a mentira de novo, percebeu-me boquiaberta e assustada com seus poderes de enganação e seguiu caminho para forjar mais corações dispostos. Gostaria de ter dito tanto, queria ter dito que ele era um canalha, um miserável e que ele nunca ia crescer na vida daquele jeito. Queria ter sido professora e ensinar o pouco que sei pra ele obre respeito, verdade, necessidade. No entanto, ele que me serviu de professor: Aprendi naquele momento que seres humanos não tem limites.

10 comentários:

  1. Uau. Serio, essa foi a unica palavra que encontrei para descrever a sua historia, parabéns :|

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  2. E não tem mesmo. Ele vai continuar assim mesmo "aminhando por esses infinitos caminhos de gente perdida." caminhando para "forjar mais corações dispostos. "

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  3. Bem... Sou obrigado a dizer que não gostei do seu post anterior... Mas vi agora, que você continua tão boa quanto antes!!

    Parabéns

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  4. Pessoal, obrigada mesmo !
    Anônimo Nº2 (rs), também não sou fã daquela música, mas eu gosto bastante dela, obrigada por comentar sua opnião (:
    Outra coisa, eu ando meio afastada do blog porque estou sem computador e só posto quando estou na casa de minha vó.

    Beijos !

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  5. acho que conheço essa história em? mas eu adoro como você conta, adoro suas palavras! - liiz.f TO COM SAUDADE!!! :(

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  6. Acho, que talvez esse tenha sido o seu melhor texto.
    Voce e incrivel, sou sua fan!

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  7. Suas postagens são excelentes. Parabéns!

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  8. Este comentário foi removido pelo autor.

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  9. camila, você escreve muito. mesmo! adorei encontrar esse lugar. não páre de escrever nunca, viu?! haha C:

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  10. as palavras ganham vida nos seus textos

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