quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Camarões à grega.

A mesa quase posta, todos os acompanhamentos estavam lá, salada, arroz, feijão, batatas, berinjelas e tudo que um dia eu já gostei. Só faltava mesmo o prato principal que, pelo cheiro, viria do cômodo ao lado. Todo mundo reunido como há muito tempo não estavam, perfumados, sorridentes e com um ar de saudade recém-morta. Lindos copos, linda toalha de mesa e guardanapos bordados a mão que tanto gostava.
A dama que ali estava sentada na ponta da mesa levantou-se e se encaminhou até uma mesa preenchida de porta-retratos. Ali estava um pequeno sino, com um duende entalhado na ponta, sacudiu-o e de lá de dentro da casa, ouvimos uma voz gritar "já vai, senhora!". Todos se voltaram para o corredor e os camarões que dali vinham. Apesar de mortos e cozinhados, pareciam incrivelmente deliciosos. Alguns se ajeitavam na cadeira e outros preparavam os garfos e facas, já outros aproveitavam os segundos que ninguém olhava pra pôr mais sal sobre o feijão.
Eu então abaixei minha cabeça, eu sou alérgica a camarão. Nunca tinha ido aquela casa, era minha primeira vez. Haviam feito todo aquele almoço para mim, me consideravam especial. Eu gostava mesmo de tudo, de todos. Da decoração, do comportamento, das roupas, dos sobrenomes e dos olhares. Estavam todos sempre dispostos para minhas vontades e para minhas argumentações.
Fechei os olhos, coloquei os dedos indicadores sobre as pálpebras, infelizmente, chamando a atenção de todos. Então eles mudaram, deixaram de comemorar e o camarão perdeu seu posto. Agora todos me observavam e me sufocavam de perguntas sobre meu estado.
Está bem? Está tudo bem? Como você está se sentindo. Você não gosta da nossa casa? Você não gosta de nós? Eu repetia, que não era casa em si, que não eram as roupas, os olhares, os porta-retratos ou os sininhos com gnomos nas pontas: Eu não gostava de camarões e não tinha avisado.

Então, passei o resto do tempo fitando o camarão pra saber se, engolia, correndo o risco, dependendo de convenções sociais. Ou então, esperava o momento certo pra avisá-los:

Eu posso morrer desse jeito.

2 comentários:

  1. Não estou certo disso, mas percebi uma pequena crítica em relação à sociedade.
    No mais, adorei o texto, bjs.

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