A menina bonita sentada na escada que corta a pequena sala parisiense em dois, com sua caneca favorita sobre a mão, seu batom cor 27, meio rosa avermelhado, sobre os lábios e channel número 5 borrifado duas vezes em seu pescoço. O amor da sua vida já se foi: era casado. Tinha largado o colégio, desistido dos estudos, deixou as amigas de lado e foi simbora com o novo par de meias. Ela recupera o ritmo dos estudos e então consegue realizar o sonho de ir para faculdade que gostaria. O filme acaba com esta menina andando de bicicleta por uma rua grande, que a câmera não acompanha, deixando o telespectador observar ela ficar pequena e ser engolida pelo horizonte. Todos os tipos de nome aparecem na tela, dos mais importantes aos mais inúteis, e depois acordamos de mais um desses sonhos e voltamos para vidas cotidianas.
Cansei disso, de tudo. Também tenho desejos: sei que você não sabia dessa. Eu também acho o garoto do outro lado da rua bonito, principalmente o vizinho com tatuagem da Abbey Road. Também quero estudar muito pra o vestibular e passar em medicina. Isso, também não quero cursar no meu estado. Também chingo, também cuspo, infelizmente, não sei arrotar: mas sinto falta disso. Não tenho casacos de pele, não costumo usar batom, nunca namorei sério e não sei falar nada além de um português bom. Sou incapacitada, então, de ser protagonista do meu único e próprio sonho?
Talvez, seja o casaco grande demais para o corpo e o corpo pequeno demais para a cabeça. Pode ser também a voz rouca, falha demais. Ou a aparência infantil demais. Mas não sou, não sou velha, não sou chata, não sou assexuada, não sou aposentada e não cheguei a menopausa ainda, entende?
Eu posso ser a pessoa a te entregar flores, eu posso escrever os poemas que um dia eu já quis ler. Eu posso dirigir um carro conversível, enquanto você canta de óculos escuros ao meu lado. Eu sei ligar o som ao máximo com uma música animada, só não sei dançar. Sou culpada por isso? Cansei de esperar que a perfeição surja batendo na minha porta, dizendo todas as letras de músicas que um dia quero ouvir de alguém: Eu cantarei as letras agora. Eu vou abraçar quem eu quiser, a hora que eu quiser, do jeito que já esperei tanto. Eu concederei o sorriso mais lindo que já recebi, bem aquele que guardo debaixo do travesseiro. Eu que beijarei no pescoço, eu que usarei meus dedos pra por o seu cabelo atrás da orelha, eu vou convidar pra ver o pôr-do-sol e esperar até ele nascer de novo pra eu dizer que amo.
Não vou deixar que vivam a vida por mim, não quero ser a eterna coadjuvante: Serei protagonista. Com a caneca, com a bicicleta e com todo o amor parisiense que um dia eu já desejei.
quinta-feira, 18 de novembro de 2010
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Simplesmente perfeito.
ResponderExcluirTão bom quanto grande é esse texto!! ^.^b
ResponderExcluirRealmente espetacular e interessante. *o*
Gostei muito da descrição dos objetos e do cenário, e tenho certeza que numa redação você iria tirar nota máxima(com chance do prof dar ponto extra).
^_^
A beleza com que escreve é de uma perfeição tão grande que me falta palavras para elogiar. Apenas lêio e me emociono com a complexidade de seus textos. Parabéns mais uma vez.
ResponderExcluirlindolindolindo.
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